viernes, 26 de noviembre de 2010

Educação: Só 500 anos?

25-07-2009


Educação: Só 500 anos?



João comprou uma casa há trinta e quatro anos na planta. Era, aliás, o único terreno ainda disponível na rua, onde foram construídas 15 casas. Logo atrás havia uma invasão, com uma casa e uma família. À medida que os filhos iam casando, mais um “puxadinho” aparecia, depois uma lage, e outra mais. Hoje, os netos estão casando, as casas até melhoraram (com a ajuda em tempos de campanha eleitoral), mas as pessoas que as habitam não. João estava varrendo o quintal de sua casa num desses dias, quando uma mãe, na casa vizinha, despejou, aos berros, um palavrório de baixo calão, com expressões chulas, sobre a filhinha de uns 2 ou 3 anos, que deve ter feito alguma traquinagem. Aí João pensou com os seus botões: eu dava uns 500 anos para o nosso país conseguir educar seus filhos para a cidadania, respeito e solidariedade, além de ensinar as disciplinas nas escolas. João é um homem esclarecido e costuma dizer que somos um país jovem de apenas quinhentos anos de existência, mas que estamos no século XXI, com todos os meios modernos de comunicação e com as facilidades de locomoção. Se não mudamos o sistema educacional não é por falta de conhecimentos, mas por má fé de alguns aos quais não interessa que as pessoas pensem e tenham espírito crítico. Por isso buscam homogeneizar as mentes para mais facilmente controlá-las.Caiu-lhe nas mãos um documento, bem a propósito, que lhe fez refletir e do qual fez questão de destacar alguns trechos:

“A indolência, a preguiça, o desânimo no labor da vida; as palavras do mendigo que supplica a caridade pública; os gemidos do esfaimado“ são conseqüências da “falta de instrucção”.“No homicídio perpetrado pelo cidadão pela embriaguez ou pela paixão” temos os sinais da “falta de instrucção”.

O documento aponta também outras causas importantes:“Folguem no desvario da estultice os ricos, os potentados, os aristocratas, engolfados no gozo da fortuna e nos arrobos das posições officiais, no aviltamento moral...”Enquanto “a máxima parte da massa popular sofre por falta de recursos próprios para se instruírem, o governo não lhes facilita a instrucção. É, sem dúvida, um abuso do poder, um erro de política, uma decadência moral, carcomendo os alicerces da instituição política”.Os dois parágrafos anteriores mostram de onde vem o mau exemplo!“Sem liberdade e sem mérito o homem se equipara às bestas.”“Obrar sem responsabilidade é bestar. Responsabilidade sem pleno conhecimento dos actos responsáveis é barbárie.”“Os governos têm o dever de aperfeiçoar os cidadãos”.“É preciso, necessário, urgente a instrucção dos cidadãos; educá-los intelectual e moralmente, despertar-lhes o amor ao trabalho, estimular-lhes o brio, excitar-lhes o amor de si, fazê-los aspirar o apreço publico de sua personalidade; promover-lhes o estímulo de economia; e a que apreciem as vantagens da riqueza honrosamente adquirida, e adquirível pela actividade própria.”“Instrucção, e somente instrucção, será a senha do progresso e do engrandecimento da humanidade”.

João logo esclarece que não transcreveu nada errado e informa que esse documento foi escrito em 1879 pelo Dr. Augusto Carneiro Monteiro da Silva Santos, Médico pela Faculdade da Bahia, Professor Cathedractico do Gymnasio e do terceiro anno da Escola Normal, no Recife. João constata desolado que se em 130 anos não houve mudanças significativas, então o seu prognóstico de mais de 500 anos não está tão fora da realidade. João acredita que a educação familiar, instrução nas várias disciplinas, mas principalmente a formação pessoal e de caráter são os principais instrumentos de uma boa educação. Vai mais longe ainda afirmando que não adianta formar um técnico que não tenha a noção plena de cidadania e respeito aos outros e a natureza. Ele sabe que o berço da educação está nas famílias e nas escolas onde os valores básicos humanitários deveriam ser incentivados nas crianças. Ele sabe também que a solução não está na multiplicação de programas de assistência, mas em projetos educacionais que formam cidadãos comprometidos com o bem coletivo. Mas ele está desolado e torce para estar enganado quanto ao tempo que isso levará!

* Psicólogo,Dr. Em saúde mental, Psicanalista e escritor- Prof. Associado - Instit. de Psicologia-UFU - Email: cvital@mailcity.com . Pós doutorando em Saúde Mental na Universidade do Porto em Portugal.Email: cvital@mailcity.com

* Teólogo, 81 anos, professor, ex- coordenador do Serviço Alemão de Cooperação Técnica e Social (Deutscher Entwicklungsdienst) e da Fase (Federação de Órgão para Assistência Social e Educacional) em Recife.
Autor do livro “confiteor, confesso, megvallom – Memórias de um homem comum”, 2004. gatihaj@gmail.com

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